quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

Escarlate

O entardecer era quente, embora distante
O Sol emudecia e, devagar, se recolhia
Num incontornável torpor escarlate,
Que fulminava a viagem entorpecida da mente.
O olhar felino, curiosamente, resgatava o oceano
Que oscilava constante.
E por entre tumultuosos bradares, 
Face a tão inconvenientes, mas supostas
Comunhões espirituais,
Encontraram-se no limbo do prenúncio da desvinculação,
Da usurpação, da rejeição.
Os tremores sucumbiam à pacificação do momento
Que antecipava glória,
Enquanto se adornavam de vestes desastrosas
E se regozijavam fortuitamente,
Sublimaram a degustação do tempo,
Já envoltas de neblina feroz 
Que anunciava a despedida vacilante,
Eminente mas, que da forma mais ingénua e diáfona,
Conhecia tão desejado retorno.

O imprevisto atua, da maneira mais súbtil,
Naqueles que são laços pré-destinados.

segunda-feira, 10 de outubro de 2016

"Eu guardo as flores mortas na sala, faço sala para o tempo"

Aguardo. Penso. Oscilo. Caio.

Prendo no peito a saudade
Guardando, pesada, o segredo.
Espalho as lágrimas pela casa...
O vento espanca as janelas da sala
E as flores mortas beijam as frestas do tempo.
O odor esquálido das petálas
Fixa-se no azul do firmamento, que eu adorno
De longe.

Estou aqui, mas a casa está vazia.
A porta mantém-se aberto.
O corpo cheio de nada,
Cambaleia pelas horas infinitas.

A Paz morreu, mas ninguém percebeu.
O Tumulto reergueu-se, efervescente por entre o breu.
Mas a Luz continua a iluminar as flores mortas na sala.

Aguardo, mas sem pensar. Ainda oscilo, mas não caio.


No Escuro

Os silêncios dançavam confusos
Por entre as luzes ofuscantes de noite anunciada felina.
Os olhos pairavam livres por entre os corpos sibilantes,
Por entre os negros inebriantes,
Por entre as falácias concomitantes.
No escuro, uma luz leve e suave, porém obscena de energia,
Iluminava incandescente a sordidez da alegria

E a harmonia, tão triste, fantasia...

O sublime devaneio surge no porto da despedida
Sorrindo, demasiado perdida.
Mas enfrenta o fracasso da postura digna,
Esquecida no passado inerte da sua vida.
No escuro, as cores ensaiam a morte dos peregrinos
E perseguem mordazes o equilíbrio onírico,
Que se esquivava, de todas as palavras.

Nesta noite, entrego-te a Lua,
Para que recordes suavemente que o escuro nem sempre nos entristece
Mas que as palavras são vãs, nos lábios dos que não vivem.
Mas repara que a Lua te ilumina as vestes que terás de abandonar ao partit.
Perdoa Lua, os que seguem o caminho que vos engana.


Cidade

Procuro nos cantos da cidade
O canto lírico do teu sabor
Onde adorno as asas enegrecidas
Que cobrem inertes o teu pensamento.
Acredito que descubras as noites
Onde encantas a terra prometida,
E eu espero a tua chegada.
Um dia.
Onde o Sol inebriará o teu sorriso doce,
Onde o calor dos nossos olhos será preciso,
Onde o luar nos encontre, longe destas luzes indecentes da cidade.

Primeiro poema (2005)

Felicidade.
Tê-la-emos nós neste repugnante mundo?
Mundo de egoístas. Oh! Lúgubre mundo…
Melancolia que me acompanhas,
Em minhas vastas e sombrias caminhadas
Que apenas fazem sentido em minhas fantasias.
Oh! Lastimáveis fantasias…
Lamentável, meu caro deplorável,
Ventura neste mundo não teremos,
Apenas após a nossa ruína a encontraremos.

Juntos, na concórdia de nossas almas.

(Partilho só por piada, o meu primeiro poema com 11 aninhos de idade)

terça-feira, 5 de abril de 2016

"Sobre a razão estar cega..."

Enquanto escuto a razão
Sigo uma canção que já não sei interpretar.
O compasso acelera, aperta e desespera
Vejo duas luzes que se fundem, estalam,
Fazendo com que o tempo ecoe o teu nome.
Sucumbe a esqualidez nas flores da sala,
Enquanto oiço os teus passos em cima do muro,
Escolho ouvi-los, mas não consigo senti-los.
Mas ainda sinto, sinto muito, mas já não te sinto.
A canção que escutas já não a sei decifrar.
Perdi o nosso rumo, na direcção oposta em que sorríamos.
Para mim, serás eterno, mas nós já não o somos.
Escuta o ténue caminhar pela brisa e leva tudo de mim. 
Tudo de nós.
Também o farei, com a sensatez que sempre nos entregamos.
Juntos, mas longe.

O coração nunca para de bater

Adeus

A Noite Pertence-nos

Respiro devagar,
Tento conter a imensidão das ondas que me perseguem
Vou-me afogando nos segundos eternos, 
Enquanto a embarcação acena, ao longe.
Escuto, bem perto de mim, essas questões
Encontro, de forma clara e sensata, essas respostas.

É ter o corpo coberto de ti, é saber a direção, é encontrar-me.
É saber que o dia foi feito para nós e que as noites nasceram de nós.
É ter a certeza de que esse barco resplandece esperança
E que a sua tripulação não sentirá mais dor.
A angústia quer expelir as palpitações desmesuradas,
Mas a vida ainda aguarda serena a nossa chegada.
Fiel aos ensinamentos, serei a manifesta razão do coração.
Não, eu não me perdi.
Apenas cheguei ao entardecer, através desses olhos que vi.

Os teus olhos.

A embarcação despediu-se, mas sorrindo.